Continuamos por séculos a distribuir títulos honoríficos aos amigos do poder e à custa de quem paga impostos
Mateus Simões | O Tempo
O Brasil cultiva uma infeliz e atrasada tradição promovida por todos os Poderes e órgãos: a concessão das mais diversas modalidades de honrarias oficiais, passando pela distribuição de diplomas honorários e chegando à entrega de medalhas, troféus e outras graças. Preservando uma lógica inaugurada pela Coroa portuguesa ao se instalar no Brasil, continuamos por séculos a distribuir títulos honoríficos aos amigos do poder e à custa de quem paga impostos.
Foto: Duke |
Homenagear não é um problema. Não falta quem mereça, quem deva receber os aplausos pelos serviços prestados à sociedade, basta ver a acertada decisão do governador Romeu Zema de entregar a Medalha da Inconfidência às forças integradas de segurança que agiram em Brumadinho. Ocorre que o poder público, no Brasil – e, especialmente, a Câmara Municipal de Belo Horizonte –, passou dos limites do razoável.
Para que se tenha uma ideia, as regras da Câmara preveem a possibilidade de 200 agraciamentos com o Grande Colar do Mérito Legislativo, além de 492 títulos de Cidadania Honorária e diplomas de Honra ao Mérito para cada legislatura.
Os números são absurdos, o que já desvaloriza o significado das homenagens, miseravelmente banalizadas. Fruto da ausência de qualquer critério de razoabilidade e parcimônia na concessão, passam a não ter qualquer valor intrínseco. Aliás, difícil ignorar que vários dos agraciados nos últimos anos estão presos, cumprindo pena pelos crimes que praticaram contra o público, o mesmo que teria prestado a homenagem.
É preciso ter em conta o gasto público gerado por esse gracejo. Nos últimos anos, a Câmara Municipal de Belo Horizonte empenhou milhões de reais em homenagens, com mobilização de espaços, aquisição de medalhas, contratação de serviços de alimentação, confecção de certificados, impressão de convites, água, energia elétrica, limpeza…
O absurdo se completa, numa caricatura ridícula e grotesca, com a notícia de que a Câmara Municipal, mobilizada por ocasião da entrega do Grande Colar do Mérito Legislativo, lançou dois editais no ano de 2017: um para comprar medalhas – tendo gastado R$ 16 mil com isso – junto com outro para destruir 163 medalhas, que nem sequer foram buscadas pelos agraciados, que, por certo, não se sentiram homenageados pela concessão da anacrônica, banalizada e desgastada honraria.
Sei que são muitas e diversas as concepções de Estado e dos papéis que possa ter, mas nenhuma delas justifica gastar milhões de reais para um procedimento sem qualquer utilidade – a não ser alimentar vaidades e insuflar apoios político-comunitário-eleitorais à custa alheia.
Num Estado democrático de direito, é permitido que políticos e particulares alimentem vaidades e insuflem apoios político-comunitário-eleitorais, desde que não o façam com dinheiro público, que alimenta os cofres do Estado após serem arrancados compulsoriamente daqueles que trabalham e produzem e que, certamente, esperam ver esses valores destinados à segurança, à educação, à saúde e à infraestrutura básica.
Por tudo isso é que apresentei um projeto de resolução para revogação expressa de todas as modalidades de homenagens hoje existentes na Câmara Municipal de Belo Horizonte.
O vereador que desejar homenagear alguém pode continuar fazendo, desde que com seu próprio dinheiro, afinal, não é o fato de ser paga com dinheiro público que faz a honra maior, ao contrário, o sacrifício das finanças públicas só a diminui.
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