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Cris Monteiro: 'Já sofri, mas hoje digo que alopecia foi a melhor coisa que me aconteceu'

Meu nome é Cris Monteiro, tenho 60 anos e depois de 30 como executiva do mercado financeiro, decidi entrar para a política. No ano passado, fui eleita para o meu primeiro mandato como vereadora em São Paulo, com 18 mil votos.

Cris Monteiro
em depoimento a Luiza Souto | Universa

Mas antes disso tudo, passei por muitos obstáculos. Tive uma infância bem pobre. Sou carioca, nascida e criada na Penha, na zona norte. Minha mãe não foi alfabetizada completamente. Era empregada doméstica quando conheceu meu pai, vendeu calcinha e sutiã por catálogo, fez bolo para fora, costurou. Meu pai, taxista, terminou o que hoje seria o ensino médio. Mas era um homem que gostava de ler.


Além das dificuldades financeiras, tenho alopecia desde os dois anos e meio. Foi quando começaram a cair placas de cabelo da minha cabeça. A alopecia é uma doença autoimune, o meu sistema imunológico acredita que os meus cabelos são um inimigo, e ataca a raiz. Tenho sobrancelha, pelo pubiano e nas pernas, há pessoas que perdem tudo.

Eu era uma criança muito estranha e sofria bullying por causa da minha condição. Era chamada de Popeye e Cebolinha, por causa disso não queria mais sair de casa, me retraí e tinha tremores noturnos.

Numa tentativa de me curar, faziam promessa para eu pagar, levavam pedaços do meu cabelo em igrejas. Uma vez, uma pessoa mandou minha mãe passar querosene na minha cabeça e me deixar sentada no sol, e assim ela fez. Obviamente não funcionou.

No entanto, hoje falo sem a menor dúvida que a alopecia foi a melhor coisa que aconteceu na minha vida. Explico: como não queria mais sair na rua, passava o tempo todo estudando, lendo livros.

Também fui chamada para um programa gratuito de ludoterapia (terapia para crianças), voltado para famílias de baixa renda e que funcionava no Instituto Philippe Pinel, um hospital psiquiátrico em Botafogo, na zona sul do Rio. Então, aos 7 anos, já estava fazendo terapia de graça e isso me ajudou muito a viver e a lidar com isso.

Digo que sou 95% bem resolvida com minha aparência, mas me causa desconforto quando vou, por exemplo, à praia, ou conheço alguém. Casei duas vezes e estou solteira. Mas durante um momento mais íntimo, tirar a peruca é desconfortável

Uma vez, comecei a sair com um cara e não falei para ele sobre minha condição, e ele não notou. Fui ao seu apartamento e, enquanto a gente se beijava, perguntei se ele não estava notando nada em mim. Falei: "Olhe bem para mim". Ele achou que eu fosse casada, mas continuei mandando prestar atenção em mim. E aí ele soltou: "Puta que pariu! Você é homem!". Respondi: "Não, eu uso uma peruca!" O cara broxou e nunca mais nos vimos. Olha que estava bem interessada no sujeito...

Já fui à beira da praia sem peruca, mas é muito desconfortável para mim. Já pensei em tatuar a cabeça. Ficar sem peruca é como mostrar uma parte íntima do meu corpo. Não é legal. Eu tenho um monte de lenço, brincos enormes e procuro ficar mais bonita possível com outros instrumentos.

Foi uma estrada muito solitária que percorri, mas sou muito feliz assim. Tentei formar um grupo de apoio para debater a alopecia. Só vejo o quão dura foi minha vida quando olho para trás. Fui rompendo barreiras sozinha, com auxílio de muita terapeuta mulher.

Do mercado financeiro à Câmara dos Vereadores

Fui trabalhar, porque sabia que precisava fazer uma faculdade. Meu primeiro emprego foi como recepcionista numa empresa no centro do Rio, perto da faculdade Cândido Mendes. Ali, só tinha curso de direito, economia e administração, e decidi fazer economia, mas depois mudei para ciências contábeis. Logo depois fui trabalhar com auditoria.

Sempre fui muito focada no meu trabalho e fui crescendo na carreira. Não era de ir a shows de bandas de rock da década de 1980 que todo mundo assistia, nem participava de atos políticos, como o impeachment do Collor, em 1992.

Em 2013, tivemos as passeatas contra o aumento da passagem e o Brasil viveu um momento político muito complicado. Aquele movimento me despertou um desejo enorme de participar, entender e discutir política com todo mundo. Conheci o partido Novo pelas redes sociais, me identifiquei e me filiei.

Os anos se passaram e em 2018, estava indo para Nova York quando recebi um e-mail do partido chamando para um processo seletivo só para mulheres, para as eleições, e me inscrevi. Saí candidata a deputada estadual, mas não fui eleita. E tentei de novo, desta vez como vereadora.

Na época, eu era chefe na empresa de assessoria financeira JPMorgan, na área de controle para toda a América Latina e Canadá, havia sido promovida, tinha prestígio, era uma diretora muito importante, ganhava talvez dez vezes mais do que hoje e não pensava em sair. Mas havia despertado em mim uma vontade de levar a minha experiência, principalmente meu olhar para as mulheres, para o poder público.

Eu não tinha noção do meu papel enquanto mulher no ambiente em que trabalhava. Fui entender depois de 40 anos que aconteciam coisas, como ser interrompida numa reunião ou ver os caras tentando explicar o que eu já tinha falado. Deixei passar muita coisa por falta de consciência

Talvez se eu tivesse a consciência que eu tenho hoje sobre a mulher em posições de poder, teria chegado muito mais alto no banco.

Sempre ouvi as mulheres, contratei quatro grávidas, uma de sete meses, promovi outras que estavam em licença-maternidade. Então, quis passar a propor políticas para as mulheres. Tenho, por exemplo, um projeto de lei em que a empresa que criar um programa de diversidade e inclusão, e promover palestras sobre prevenção ao assédio moral entre outras coisas, vai ganhar um selo comprovando que ela é amiga da mulher, e esse público vai poder consumir mais o produto ou serviço dessa empresa.

Vergonha de ter votado em Bolsonaro

Sei que vim de uma área com pouca representatividade feminina, e estou em outra onde a maioria é homem. Vivi comentários e olhares constrangedores ao longo da carreira, do tipo: "Nossa, que boca que você tem." Mas aprendi a lidar com o machismo trazendo meus pares para a consciência.

Já fui muito mais combativa, muito mais abrasiva. Agora, eu não parto para o ataque, eu trago o sujeito para o meu campo, sem agressividade. Isso funciona muito melhor para a minha saúde mental do que entrar num embate.

A política é um ambiente bem diferente do que vivi no mercado financeiro, mas as pessoas são muito agradáveis comigo na Câmara. Por ser de uma ideologia mais liberal, achei que as pessoas não iam querer falar comigo, mas me dou muito bem com os meus colegas.

Pedi recentemente, por exemplo, para ser coautora do projeto de lei que pretende levar a Semana Maria da Penha nas escolas do município, da vereadora Erika Hilton (PSOL), porque o projeto é ótimo e não quero ficar olhando para o partido.

Também tenho como bandeira a educação, e recentemente acompanhei a discussão de um colega sobre o "Escolhi Esperar", sobre esperar o "momento certo" para começar a ter relações sexuais. Ele ainda não foi votado, mas sou contra. A gente precisa discutir sexualidade com as crianças e os jovens na medida em que eles estão aptos para escutar essa conversa, e a gente sabe que a abstinência não funciona.

É preciso ensinar o jovem sobre o seu corpo, tanto o homem quanto a mulher, falar dos prejuízos que uma moça pode ter com a gravidez precoce. Precisamos discutir gravidez precoce com base em ciência, em estudos, em dados e não em bases em crenças.

No ano que vem vamos ter eleições presidenciais. Meu desejo e minha expectativa é que a pessoa que atualmente ocupa esse cargo seja lançada um lugar de onde nunca deveria ter saído, que é um buraco qualquer. Ele certamente foi uma das piores coisas que já aconteceu. Tenho vergonha de dizer que votei no Jair Bolsonaro (sem partido).

Também não quero o ex-presidente Lula (PT) de volta. Ele deveria passar por um novo julgamento, porque existem provas cabais de que cometeu crimes. Gostaria muito de encontrar uma terceira via para o país.

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