Deputado federal mais votado no RS elege a reforma da Previdência como o principal desafio do primeiro ano de Jair Bolsonaro
Mateus Ferraz | GaúchaZH
Deputado federal mais votado do Rio Grande do Sul nas últimas eleições, com 349,8 mil votos, Marcel van Hattem representa uma nova geração de políticos que se declaram liberais na economia e conservadores nos costumes. Um dos oito parlamentares eleitos pelo Partido Novo no país, foi escolhido para ser o líder da bancada pela experiência como deputado estadual gaúcho e vereador de Dois Irmãos, no Vale do Sinos.
Deputado é um dos candidatos à presidência da Câmara | Julio Soares / Divulgação |
Crítico ao PT e otimista com o novo governo, Van Hattem elege a reforma da Previdência como o principal desafio do primeiro ano de Jair Bolsonaro no Palácio do Planalto, com mudanças que atinjam militares e políticos. Entusiasta da meritocracia, diz sofrer preconceito por ser um branco que defende o fim das cotas raciais nas universidades.
Em quatro anos, o senhor passou de suplente de deputado estadual a deputado federal mais voltado do Estado. Como ocorreu essa mudança?
Foi importante para isso a minha coerência. Nunca me intimidei com oposição, gritos, vaias. Sempre mantive a postura e a firmeza representando meu eleitor. As redes sociais ajudaram muito. Também há a coerência aos princípios e valores que estavam sendo buscados pelo cidadão. Depois de tantos anos de esquerda dominando a política, ela acabou se desgastando com a ineficiência do governo e das políticas públicas e também com a corrupção.
Como será sua atuação na Câmara? Há projetos prontos para serem apresentados?
Nós, do Novo, temos uma responsabilidade grande com o que defendemos: manter o partido sem o uso do Fundo Partidário. Queremos apresentar, no início do mandato, uma proposta para extinguir o Fundo. De resto, por estar assumindo a liderança do partido (na Câmara), minha atuação vai ser temática conforme o que a bancada definir. E também vou ter atuação forte na defesa do Rio Grande do Sul e, em particular, na questão da segurança. Precisamos reformar as leis de execução penal e os presídios, solucionando o déficit de vagas. A
As emendas parlamentares são utilizadas pelo Executivo em busca de apoio no Congresso. O senhor vai usá-las?
Sou contra as emendas como moeda de troca, embora, infelizmente, seja o que vem sendo feito nos últimos anos. Esse sistema não funciona, está viciado. Agora, já que elas existem, precisam ser utilizadas. Estabeleceremos critérios, os mais objetivos possíveis, para o encaminhamento dessas verbas. Significa que um hospital, para receber, precisa estar bem ranqueado, ter boa gestão. Senão é desperdício de dinheiro.
O senhor apoiou no Jair Bolsonaro no segundo turno das eleições. Como será sua postura na Câmara? Vai integrar a base aliada?
Não. O apoio a Bolsonaro se deu por ele ser contra o PT. Nosso candidato era o João Amoêdo. Como ele não foi para o segundo turno, e com a ameaça da volta do PT ao poder, não havia outra alternativa. Agora, como deputado federal, vou manter a postura de independência, que é não ser oposição só para ser contra o governo, nem ser base, aprovando tudo sem olhar com critério.
O senhor está satisfeito com o início do governo?
Os primeiros movimentos têm sido favoráveis ao Brasil. Houve a nomeação de um ministério qualificado, sem a interferência de partidos políticos, há a possibilidade de uma reforma da Previdência já no primeiro semestre, com o ministro da Economia, Paulo Guedes, com quem nós temos grande afinidade por ser liberal. E o ministro da Justiça, Sergio Moro, é um ícone no Brasil no combate à corrupção.
Episódios como as suspeitas que recaem sobre Flávio Bolsonaro causam prejuízos à imagem do governo?
O governo pode sair arranhado de maneira mais profunda, dependendo dos fatos. O que nós temos até agora são muitas versões. Os fatos nós não conhecemos e, por isso mesmo, o (ex-assessor) Fabricio Queiroz e, principalmente, Flávio Bolsonaro estão sendo chamados a dar explicações. E não só eles. Na Assembleia do Rio, 27 deputados estão sendo chamados. Espero que as versões apresentadas (das suspeitas contra o filho do presidente) não sejam confirmadas. Isso seria muito ruim para o governo.
Jair Bolsonaro é muito criticado por líderes de movimentos sociais. O cuidado com o social pode ficar prejudicado no governo?
Não acredito nisso. Uma coisa são as falas do Bolsonaro, algumas delas deploráveis, algumas que ele mesmo disse se arrepender de ter dito no passado. Outra coisa são as atitudes do governo. Até agora temos visto um ministério bastante preocupado com a questão social. Também considero que falas mais duras, sem entrar nas que podem ser preconceituosas, são duras de fato. Houve muita corrupção no Brasil, desvios, e ele foi um candidato que bateu muito nessa tecla. Uma fala dura não precisa ser contra o social. Pelo contrário, muitas vezes ela privilegia o social.
Bolsonaro ataca a corrupção e os privilégios, mas ele se serviu de privilégios durante os 28 anos em que foi deputado. Não há contradições?
Essa foi uma crítica que o Partido Novo fez e que é mantida. Nós sabemos que a opinião do presidente, não só em relação aos privilégios, mas às pautas econômicas que hoje ele defende, no passado não foi a mesma. Ele votou contra o Plano Real, contra a reforma da Previdência diversas vezes, votou contra uma série de reformas microeconômicas. Espero que sejam apenas contradições e que agora o exemplo seja outro.
Há muitas críticas ao presidencialismo de coalizão e às negociações políticas. Não é possível haver negociações entre Executivo e Legislativo de forma legal?
Sem dúvida que é possível. Isso se chama articulação política. Nem gosto de usar a palavra negociação, que, no fundo, parece implicar uma transação financeira. A articulação é necessária em uma democracia.
A reforma da Previdência será o primeiro grande desafio do governo, mas ela será legítima sem a presença dos militares?
Ela precisa incluir todos, inclusive os políticos. A aposentadoria especial de deputados não se sustenta, e nós, do Partido Novo, decidimos não aderir. O mesmo exemplo deve ser dado por outras categorias, inclusive os militares. Temos de cortar na própria carne. Hoje, a Previdência é uma grande transferência de renda dos mais pobres para os mais ricos.
Como o senhor avalia a postura do chanceler Ernesto Araújo, que critica o que chama de "globalismo"?
O globalismo é mal compreendido porque o tema é pouco debatido, sobretudo no meio acadêmico, que privilegia teses de esquerda em detrimento de outras formas de abordagem. O globalismo define que muitas instituições supranacionais, como a União Europeia (UE), são órgãos burocráticos, não eleitos democraticamente, indicados por governos e que tomam decisões que podem ferir a soberania nacional. A UE demonstrou isso de forma cabal com o Brexit (saída do Reino Unido da UE). As declarações de Ernesto Araújo vão nesse sentido, e é importante que a gente tenha essa mudança na visão da política externa brasileira, que teve um período de transição no governo de Michel Temer, mas que antes privilegiava as relações Sul-Sul e com países subdesenvolvidos. Nós temos de ter portas abertas com todos os mercados no mundo, sem preconceitos.
O Novo sempre defendeu a liberdade de a pessoa ter uma arma. Bolsonaro justificou a facilitação da posse como ação contra a violência urbana, para que o cidadão possa se defender. Qual é a sua avaliação?
Ele está errado. Considero um equívoco o governo vincular o direito da pessoa ter uma arma à estatística de criminalidade. Não é política de segurança pública. Essa política envolve a capacidade do Estado de prover segurança, de ter policiais bem treinados, valorizados, ter presídios com capacidade de receber presos, ter legislação que não seja frouxa como a que a gente tem. Agora, o direito a possuir um meio de defesa é um princípio, e é por isso que o Novo o defende. O direito de defesa do cidadão é exercido para se defender de um Estado tirano, se um dia houver um governo oprimindo a população, e para o cidadão ter o direito de se defender quando as políticas públicas de segurança falham.
O senhor estava ao lado de Temer em sua posse após o impeachment de Dilma Rousseff. Qual sua análise sobre o governo Temer?
Eu estava em Brasília em virtude do impeachment e participei da posse representando o Rio Grande do Sul. Foi mais uma postura de acompanhamento e de fiscalização do que de apoio. A população brasileira nutria muita esperança com o governo Temer em virtude do legado de Dilma Rousseff e do PT ter sido desastroso. Esperava-se que fosse um governo que liberalizasse bastante. E, de fato, liberalizou um bom bocado da economia brasileira. Mas não conseguiu ir além porque, como o governo anterior, foi flagrado em episódios terríveis de corrupção.
A democratização está fragilizada hoje? Ela corre perigo?
Pelo contrário. Acho que está cada vez mais forte devido à participação da população, por meio das redes sociais, da valorização das instituições, dos questionamentos que as pessoas têm sobre os papéis dos políticos, coisas que a gente não via no passado. Isso só fortalece a democracia.
Como o senhor vê o papel do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Judiciário neste momento?
O STF acumulou funções que não são suas. É uma corte constitucional, mas, hoje, legisla. Acaba julgando casos criminais que trancam a pauta para muitos outros assuntos e, inclusive, está exercendo um poder moderador na nossa República, o que é muito ruim. Estamos vivendo a judicialização da política, porque deputados, muitas vezes, acabam recorrendo ao STF para resolver querelas que deveriam ser dirimidas no parlamento. A politização da Justiça está escancarada nas indicações de ministros: a sabatina é mal feita no Senado, o que faz com que as indicações não sejam tão criteriosas.
Como o Novo defende que seja feita a indicação?
Não temos uma proposta fechada. O principal problema não está na forma de indicação, mas na sabatina mal feita no Senado. Eu incluiria uma possibilidade de, após cinco ou 10 anos, fazer uma reavaliação do ministro para que ele siga ou não no cargo. Nos Estados Unidos isso é normal.
O presidente da República tem muito poder no Brasil? O que o Legislativo pode fazer em relação a isso?
Sim, tem poder demais, a começar pela edição de medidas provisórias (MPs), que trancam a pauta e deixam o Congresso paralisado. Isso precisa parar. Os deputados têm de recuperar seu poder. Precisamos discutir melhor qual é o nosso papel e sermos mais criteriosos na avaliação das MPs, se elas realmente têm relevância e urgência. Um exemplo: o programa Mais Médicos foi implementado por uma MP. Dilma Rousseff assinou-a e, no dia seguinte, os médicos cubanos estavam pegando avião para o Brasil, sem que os plenários da Câmara e do Senado debatessem o tema. O Executivo precisa ter menos poder. Por isso defendo o parlamentarismo, que separa as funções de Estado e governo.
O Brasil precisa de uma nova Constituição?
Não dá mais para continuar com a atual. Ela reflete um momento histórico de quando foi elaborada, clamando por mais direitos sociais, e não necessidades atuais. Muitas prerrogativas e direitos, mas poucos deveres. Precisamos, no mínimo, de uma reforma constitucional para que ela seja enxugada e para que muitos artigos possam passar a ser aquilo que são: legislações infraconstitucionais ordinárias ou complementares.
O senhor é a favor da reeleição em cargos no Executivo e no Legislativo?
Sou a favor da reeleição no Executivo, desde que o poder do chefe desse poder seja menor do que é hoje. No Legislativo, o Novo estabelece só uma reeleição consecutiva. Depois, o político volta para a sua atividade ou concorre a algum outro cargo. Nós acreditamos que é salutar a renovação.
Quando estava na Assembleia, o senhor se declarou contrário ao aumento do ICMS proposto pelo governo Sartori. Na Câmara, seguirá contra aumento de impostos?
Sou contra qualquer tipo de aumento de impostos, a não ser em casos de redução de receita por compensação do aumento de uma determinada alíquota e redução de outra.
O foro privilegiado, já limitado pelo STF, tem de ser ainda menor?
Ninguém precisa ter foro privilegiado. O foro perdeu a função originária. Deveria garantir que alguém pego roubando dinheiro público fosse julgado de forma célere. E virou um privilégio. O STF e os Tribunais de Justiça não dão conta do que têm e acabam suspeitos de privilegiar os amigos no poder.
Na Assembleia o senhor devolveu a diferença salarial referente ao aumento concedido na legislatura anterior. Na Câmara, vai abrir mão de benefícios oferecidos?
Vou abrir mão do auxílio-mudança e do auxílio-moradia e vou usar menos do que a metade dos assessores a que teria direito. Toda economia que eu fizer é para dar exemplo de que é possível fazer mais com menos. Se nós não começarmos a dar o exemplo, não temos como cobrar dos outros.
O senhor apresentou na Assembleia o projeto Escola Sem Partido. Com qual objetivo?
Principalmente debater o tema. Costumo dizer que o projeto não é para ser aprovado, mas para ser discutido. Seria ingenuidade acreditar que aprovando uma lei nós resolveríamos um problema que é mais profundo. Atinge pais, alunos, muitos bons professores que se sentem constrangidos por colegas que fazem proselitismo partidário e doutrinação em sala de aula.
É possível defender a meritocracia em um país com tanta desigualdade e a bagagem histórica que o Brasil tem? O senhor acredita, por exemplo, que as condições de todos podem ser semelhantes para acessar a universidade sem cotas?
Sou contra as cotas porque elas são racistas, dividem a sociedade. São tão racistas que, por eu ser branco, muitas pessoas a favor das cotas dizem que sou preconceituoso por ser branco e ser contra. Elas estão sendo preconceituosas com minha cor da pele ao dizer que meus argumentos não valem nada. Em relação aos dados disseminados, muitas dessas organizações não governamentais e movimentos sociais são de esquerda. Os dados são deturpados para tentar vender algo que, muitas vezes, não é bem como deveria ser. Por exemplo: a questão de haver maior mortalidade entre negros acontece porque há também um maior número de negros nas periferias, onde há maior violência em virtude de uma série de fatores. Há muitos mortos no Brasil em geral: são mais de 70 mil homicídios por ano de gays, héteros, negros, brancos, ricos, pobres. Esse problema não se resolve criando mais distorções e injustiças.
Qual é sua expectativa para o país nos próximos quatro anos?
Minha expectativa é de que o Brasil melhore bastante e que a Câmara dos Deputados possa contribuir muito para os debates que o Brasil precisa. Nós vamos ter muitos bons deputados com boas ideias que vão opinar em todas as comissões porque a população está em cima. A democracia está se consolidando, as pessoas estão acompanhando pelas redes sociais e querem ter uma participação mais ativa. Acredito que em quatro anos vamos ter um Brasil melhor do que esse que nós temos hoje.
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