Por Cristiano Martins | O Tempo
O desgaste da classe política e o aumento da rejeição popular levaram alguns partidos a renovar marcas e até a mudar de nome. Só as urnas poderão indicar os desdobramentos dessa tendência, mas este novo levantamento de O TEMPO revela que as legendas tradicionais de fato perderam filiados em Minas Gerais, enquanto – coincidência ou não – aquelas com identidades reformuladas e intencionalmente desvinculadas da retórica convencional aparecem entre as que mais cresceram desde 2016.
O desgaste da classe política e o aumento da rejeição popular levaram alguns partidos a renovar marcas e até a mudar de nome. Só as urnas poderão indicar os desdobramentos dessa tendência, mas este novo levantamento de O TEMPO revela que as legendas tradicionais de fato perderam filiados em Minas Gerais, enquanto – coincidência ou não – aquelas com identidades reformuladas e intencionalmente desvinculadas da retórica convencional aparecem entre as que mais cresceram desde 2016.
No outro extremo, o Avante aglutinou 11 mil novos filiados em Minas depois de abandonar a sigla PTdoB. O Podemos (ex-PTN) e o Patriota (ex-PEN) registraram crescimentos até mais expressivos ao trocar de denominação e ainda incorporar outros partidos inteiros – PHS e PRP, respectivamente. Em termos proporcionais, quem mais cresceu foi o NOVO (520%), impulsionado em Minas pela eleição de Romeu Zema como governador em 2018.
‘Tradição fala mais alto’
As mudanças de identidade afetam os números em “pouco ou nada” na opinião do deputado federal Newton Cardoso Jr., presidente do MDB em Minas. A legenda dele tirou o “P” do antigo nome (PMDB) no fim de 2017, e uma ala chegou a defender que o partido se chamasse apenas “Movimento” depois de importantes derrotas políticas nos últimos dois anos, como a perda das presidências da Câmara e do Senado.
“O que reflete mesmo é a adoção de bandeiras vinculadas ao real interesse público, e o cumprimento delas. Essa é provavelmente a maior marca do MDB mais recente. De um ano para cá, o partido trocou todo o seu diretório, e essa renovação vem de encontro a esse momento. O MDB está preparado nesse novo ambiente”, defende.
Com 198 mil filiados, o partido pretende se manter também como o maior em número de eleitos. “É uma posição importante, mas desafiadora. Devemos ter um recorde de candidaturas, com isso é necessário distribuir a aplicação dos recursos e promover estratégias vencedoras, para que o partido continue nessa liderança. A tradição do MDB fala sempre mais alto”, acrescenta Newton Jr.
A perda de quase 24 mil correligionários (10,7%) não preocupa o deputado. “O partido é muito grande e está presente em todo o Estado há muitos anos, então há uma série de filiados que infelizmente vão falecendo, outros que vão deixando os registros muito antigos... Nós procuramos fazer a atualização na Justiça Eleitoral, e ela é cada vez mais digital, então acaba sendo um número mais realista. É algo natural”, argumenta.
Principal alvo da onda recente de rejeição à política tradicional, o PT promete abraçar a sigla e as marcas próprias, ao contrário do que ocorreu nas eleições gerais de 2018. “Temos muito orgulho da nossa história e vamos usá-la. Não vamos esconder nada”, afirmou o deputado estadual Cristiano Silveira, presidente do diretório mineiro. O partido segue como segunda força do Estado, com 169 mil associados, após uma queda de 9,5 mil inscritos (5,3%).
Já o PSDB pretende se reapresentar ao público como uma opção consolidada no centro do espectro ideológico, “bem longe dos extremos, da radicalização e da política do ódio”, segundo o presidente estadual da sigla, Paulo Abi-Ackel. O deputado federal adiantou que o partido lançará nos próximos dias uma campanha nas redes sociais reforçando esses ideais.
“Vamos mostrar o que é a social democracia e porque é o modelo que dá certo. Traçar exatamente as diferenças entre socialismo, liberalismo, centro, esquerda e direita. Parece sinal de trânsito, mas não é. O PSDB tem serviços prestados ao país tanto com bandeiras da esquerda, como a melhor distribuição de renda, quanto da direita, como a privatização de empresas, mas sempre com equilíbrio”, explica.
Abi-Ackel também credita a perda de filiados a uma atualização dos registros. “Em relação a 2016, que acredito ter sido um ótimo momento para o PSDB, não considero queda, e sim uma estabilização em cima de uma base real, pois fizemos um recadastramento. Temos, de fato, filiados orgânicos e comprometidos com o ideário do partido”, justifica. A legenda sofreu uma redução de 5,8% e possui atualmente 146 mil associados em Minas.
Sobre a moda das trocas de alcunha, Abi-Ackel não enxerga essa possibilidade no futuro da sigla. “Isso começou na Europa e é natural que o Brasil copie. Surgiram nomes remetendo a um maior entusiasmo com a política. Eu acho salutar, não vejo nenhum problema. Mas o PSDB vai continuar sendo PSDB”, declara o presidente estadual. “As nossas metas são ambiciosas, e a expectativa é de crescimento e fortalecimento para 2020”, finaliza.
Rejeição em alta
Os partidos políticos registraram a maior rejeição popular (71,3%) dentre todas as 19 entidades listadas na segunda edição da pesquisa nacional “A Cara da Democracia”. O estudo foi realizado em novembro de 2019 e divulgado no início deste ano pelo Instituto da Democracia e da Democratização da Comunicação (INCT), vinculado à UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) e outras 11 universidades.
No campo da política, o índice de reprovação foi mais baixo em relação ao Congresso (50,2%), à Presidência da República (44%), ao STF (42%) e ao Poder Judiciário (38,2%), por exemplo. As entidades com a menor desconfiança, por outro lado, foram Polícia Federal (20%), Igrejas (21,9%), Forças Armadas (23,5%) e Polícia Militar (27%).
O cientista político Felipe Nunes, da UFMG, explica que o sistema partidário brasileiro encontra-se em franco processo de transição entre um cenário polarizado em torno de duas grandes siglas, como PSDB e PT, e um novo momento extremamente fragmentado.
"Essa transição se dá por vários fatores. Primeiro, pelo desgaste que os partidos tradicionais têm hoje. MDB, PT e PSDB, para citar alguns, sofreram muito nos últimos anos com os escândalos de corrupção. Com isso, candidatos procuram partidos menores, sem rejeição declarada junto ao eleitorado", detalha o especialista.
Segundo Nunes, a nova regra que impõe o fim das coligações nas disputas proporcionais também incentiva a pulverização das candidaturas. "Os políticos que já têm um mandato buscarão ser puxadores de voto em diferentes partidos. Isso tende a aumentar as chances da reeleição. Por fim, o alto número de partidos com representação na Câmara dos Deputados força os parlamentares a tentar construir bases políticas ligadas aos seus mandatos no maior número possível de cidades, para aumentar as chances de ter aliados municipais para a eleição de 2022", acrescenta.
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